[CL] Novo Rumo

Abri meus olhos e acordei... ou acordei e só depois abri os olhos, não sei, não é o tipo de conceito que estou em condições de refletir no momento. Enfim. Quando abri os olhos, a luz do corredor invadindo meu quarto com a chegada de Garceov, reparei que o aposento todo parecia de cabeça para baixo. Ah, não... eu é quem estava de cabeça para baixo, apenas as pernas sobre a cama, enquanto meu tronco e cabeça haviam caído para fora sem eu nem reparar, repousando sobre as roupas que eu sequer lembrava de ter despido na noite anterior. Alias, eu não lembrava nem do momento em que tinha vindo para o quarto e me deitado.

- Parece que essa foi uma noite e tanto, não é mesmo? Hahaha - falou o homem ascendendo a luz do quarto, sua gargalhada fazendo minha cabeça latejar um pouco mais do que instantes antes e a nova luminosidade ofuscando totalmente minha visão por alguns segundos.

Sentei-me na cama para tentar organizar meus pensamentos, mas o movimento repentino, com a mudança do fluxo do sangue, só fez foi minha cabeça girar ainda mais. Tudo o que consegui fazer foi puxar o lençol para cobrir minha nudez com uma mão enquanto levava a outra à cabeça. - Ai...

- Não se preocupe, isso é normal, todo mundo passa por isso e com o tempo se acostuma. - explicou, parecendo se divertir com a situação - Mas tenho que admitir, pra um marinheiro de primeira viagem tu até que aguentou bem. Nunca tinha visto alguém inexperiente beber tanto assim de uma só vez e não passar mal, a não ser pela... bem, não importa. De qualquer forma, vista alguma coisa e suba para tomarmos café, vai te ajudar a se recuperar.

O homem saiu do quarto e, assim que consegui organizar minha cabeça o suficiente, fiz o que ele havia sugerido, pegando as roupas que estavam jogadas espalhadas pelo chão e vestindo-as para subir. Além da minha cabeça pulsando de dor, meu senso de equilíbrio também parecia ter sido afetado, então subi as escadas próximo ao corrimão, para evitar acidentes indesejados.

Logo que subi, meu nariz foi invadido pelo perfume da culinária de Atalanta. Posso dizer que isso, por si só, já ajudou a me animar um pouco.

- Venha, Rick. Coma alguma coisa.

- Aqui, mestre Richard. - disse a IA, servindo-me meu café da manhã. Parecia muito saboroso.

Comecei a comer e, em instantes, havia devorado a refeição. - Nossa, eu não tinha percebido que estava com tanta fome.

- Não se preocupe, se alimente bastante que vai ajudar a curar a ressaca. - Atalanta serviu-me mais um pouco, que logo segui comendo - Logo mais eu estou de saída para a Academia. Se quiser uma dica para melhorar rápido e poder focar no teu projeto, te sugiro beber bastante água e transpirar bastante. Quando eu bebo demais e preciso me recuperar pro outro dia, acordo mais cedo e passo um tempo na sauna. Transpiro o álcool todinho e fico praticamente bem em pouco tempo. Fiz isso essa manhã, inclusive. Hahaha

Não muito tempo depois Garceov já partia para trabalhar, avisando à IA - Atalanda, Rick ficará em casa para completar um projeto, como já sabe. Ajude no que ele precisar e te pedir, está bem? - e então eu, munido de uma toalha e uma garrafa de água com revestimento térmico para que não esquentasse, desci e fui para a sauna. Eu já havia estado ali apena suma única vez antes, na semana em que tinha ficado sozinho e decidido desfrutar e experimentar de todas as mordomias que haviam pelo apartamento - recomendações do próprio Garceov.

Eu particularmente achava estranho ficar dentro de uma sala fechada e abafada, usando do calor para suar, mas haviam estudos que diziam que ajudavam até mesmo no rejuvenescimento da pele e na liberação de toxinas pelo suor, e como foi uma recomendação, não custava tentar. E posso dizer, meia hora depois, tomei meu banho nos chuveiros que haviam na saída da sauna e sentia-me quase que novo em folha.

Poderia, enfim, me concentrar no meu projeto.

Eu já havia me decidido: faria o curso de Engenharia Mecatrônica. Eu sempre lidara com questões de energia, pois era com o que eu trabalhava em Pardosa, e nunca pensei em sair do ramo. Contudo, pude perceber que eu aspirava por mais do que isso, por muito mais do que seguir fazendo aquilo que Clifford esperava de mim. Eu gostava de criar, de inventar, e as possibilidades que o curso me traziam deixavam-me por demais animado com o futuro que eu poderia ter. Afinal, tudo o que eu mais aspirava era por liberdade, e haveria algo mais libertador do que poder criar tudo aquilo que minha mente pudesse imaginar?

De qualquer forma, minha tarefa era desenvolver um robô ou sistema pra realização de tarefas simples. Eu tinha que começar, antes de mais nada, definindo que tipo de tarefa simples eu queria que fosse realizada, e então pensar em como faria isso.

Pensei primeiro nas tarefas cotidianas do dia a dia, como limpeza e cozinha, mas o primeiro era algo que já haviam milhões de robôs e sistemas diferentes com seus próprios jeitos, enquanto que o segundo... bem, se considerar o tanto de dados, programação e afins que precisaria, acabaria deixando de ser simples.

Sentado à escrivaninha do quarto, olhei em volta, tentando pensar em algo que pudesse se encaixar no que eu precisava. E foi então que, mirando o chão, lembrei-me de minhas roupas espalhadas e amontoadas pela manhã. Haviam muitos sistemas e equipamentos para limpezas em geral, e também para lavagem de roupas, mas havia algum para dobrá-las?

Peguei minha Pokédex, um cabo adaptador e subi as escadas correndo, já totalmente esquecido da ressaca. - Atalanta! - chamei. A IA não estava na sala. Fui até a cozinha, também não estava lá, tampouco na lavanderia. Ao sair da cozinha, me deparo com ela no meio da sala. De onde ela tinha saído? Bem, não importava.

- Chamou, mestre Richard? - questionou, como sempre muito educada.

- Sim, sim... Então, é sobre o projeto que eu to pensando... - comecei, escondendo minha pokédex e o cabo às minhas costas - Dentre as tuas programações, existe alguma específica de dobrar a roupa ou isso foi algo que tu aprendeu por observação?

- Minha programação base foi extremamente simples. Por muito tempo tudo o que eu fazia eu aprendi por meio de observação, apenas de uns poucos anos para cá que mestre Garceov passou a instalar programações específicas já prontas em mim. Mas, ainda assim, tarefas como essa eu organizo em uma programação específica e de fácil acesso. Qual seria a razão da dúvida?

- Então, será que eu poderia só dar uma olhada nos dados programados, apenas pra ter uma base de como eles são construídos? - anunciei, sorrindo, então revelando minha pokédex em uma mão e o cabo na outra, aproximando-me a passos lentos da IA.

- Mas... n... Não pode ser algo que eu possa lhe falar ou explicar eu mesma, sem necessidade disso? - Atalanta deu dois passos para trás, erguendo sua mão e parecendo temerosa.

- Huuum, talvez, mas isso seria muito pouco efetivo, e talvez até um pouco demorado. Não, é mais fácil eu ver com meus próprios olhos mesmo. E nem tente resistir, não lembra o que Garceov disse? Ele ordenou que me ajudasse, e é assim que vai me ajudar, então vamos? - continuei me aproximando, ela já não tinha para onde escapar.

- Não, mestre Richard, por favor... não... nããããão... - reclamou, enquanto eu conectava minha pokedex à entrada que havia em sua mão.

Num primeiro momento, a minha tela foi simplesmente bombardeada de informações simultâneas, até que tudo fosse organizado. Ainda assim, era muita coisa, então chamei Glintch para me ajudar a buscar a programação que eu precisava. O Pokémon rapidamente aceitou, e levou apenas alguns instantes para encontrar os arquivos e transferi-los para uma pasta na minha Pokédex. Preferi assim para que não me demorasse muito, considerando que Atalanta parecia realmente desconfortável por ter seu sistema acessado por alguém além de Garceov.

- Desculpe, não achei que seria algo tão problemático assim. Mas prometo que a transferência já está terminando, ok?

Glintch, contudo, era quem aprecia realmente curioso com tudo o que encontrava ali. As luzes em suas mãos piscavam de uma maneira frenética, como eu nunca o via fazer antes. O pequenino olhou para mim, e então para a tela de minha Dexit, na qual surgiu uma imagem. Uma fotografia, pra ser mais preciso. Contudo, ela fixou-se ali por um único e breve instante antes de ser substituída por um aviso de bloqueio "Arquivo Restrito", logo seguido pelo aviso de término da transferência dos parâmetros de programação que eu precisava. No mesmo instante, a própria Atalanta retirou o cabo de seu conector, e ela não parecia nada feliz com Glintch, com quem sempre havia se dado bem.

Glinch, por sua vez, deixara sua costumeira pose indiferente e parecia sentir-se extremamente culpado. O que mais ele teria visto além daquela foto para causar uma reação assim?

- Atalanta, aquela foto...? - sim, pois, ainda que tivesse acontecido tão rápido que eu não tivesse conseguido absorver nenhum detalhe na imagem, eu pudera perceber rapidamente que haviam duas pessoas ali: uma parecia muito comigo, com os cabelos laranja e o mesmo tom de pele, mas com um tipo de postura diferente que não tive tempo de identificar. E, ao lado, uma garota que eu podia jurar ser uma versão anos mais jovem da própria Atalanta.

- Minha programação base não me concede permissão para prestar quaisquer informações de dados sensíveis e restritos que constem em meu sistema. - disse, apenas, em um tom totalmente desprovido de emoção - Agora, se me dá licença, mestre Richard, tenho tarefas domésticas a realizar.

Sem mais explicações, a IA segui para a cozinha, deixando-me ainda mais confuso, e Glintch transtornado.

Post interativo, com início da busca por coisas pro projeto, bem como fixação em on do curso escolhido. Sem necessidade de avaliação.

Já em meu quarto, pluguei minha Pokédex ao computador para abrir os arquivos que havia copiado de Atalanta. Estavam todos codificados, mas eu precisava verificar tanto sua configuração em código quanto seu comando correspondente, então abri o aplicativo de transcrição para ter ambas as telas simultâneas. Conforme o programa ia transcrevendo as linhas de comando, fui lendo a decodificação e achei certa graça no que vi.

"Mestre Garceov não gosta de suas camisas dobradas ao meio, mas aos lados;
Não dobrar as roupas de mestre Garceov do avesso - ele não verifica ao vestir; [...]"

Dentre tantos outros comandos específicos que pude ler. Foi então que identifiquei, dentre os mais recentes, alguns com meu nome.

"Verificar se Mestre Richard dobrou as próprias roupas. Se sim, refazer o trabalho para evitar que amarrotem[...]"

Parei a leitura por ali. Todos os comandos eram extremamente específicos e casuais, não parecia haver algo que eu pudesse aproveitar para aquilo que eu queria desenvolver. Então era essa a "organização" de software que ela havia feito? Parecia mais uma lista carinhosa de gostos e manias daqueles de quem ela cuidava, o que fez com que eu me sentisse ainda mais culpado por ter acessado seu sistema, mesmo ante as negativas dela.

De qualquer forma, eu ia precisar criar eu mesmo, a partir do zero, as linhas de comando e toda a programação do robô, o que certamente daria um enorme trabalho, ainda mais considerando que eu estava mais acostumado a coisas físicas e não códigos. Contudo, para que eu pudesse definir tudo o que eu precisaria fisicamente, eu precisava definir que tipos de tarefas e movimentos ele teria que ser capaz de realizar. E foi assim que botei a mão na massa. ou nos códigos, pra ser mais preciso.

Spoiler:

Em minha Pokedex, abri um novo arquivo e transcrevi ali todos os códigos de comandos e suas respectivas funções, criando uma lista. O exercício já me ajudou a lembrar de alguns que eu estava pouco familiarizado. Depois, deixando a lista aberta ao lado, abri um novo arquivo no computador e comecei o longo trabalho de escrever linha por linha de código. Glintch me ajudou muito com isso. Ele não conhecia as linhas de códigos, mas conseguiu memorizar os padrões, de modo que quando eu digitava algo errado - uma letra ou símbolo - ele rapidamente o corrigia.

Estávamos tão concentrados que sequer vimos a hora passar, tampouco ouvimos a porta do meu quarto ser aberta. Apenas nos demos conta da presença de Atalanta - também preciso dizer que ela é bem silenciosa mesmo - quando ela já estava ao nosso lado.

- Seu almoço, mestre Richard. - trazia em seus braços uma bandeja completa, com um prato coberto, uns pãezinhos torrados e suco.

Em dois instantes tratei de abrir espaço na mesa para que ela pudesse dispor as coisas, ficando somente com a bandeja vazia. Quando ela fez menção de dar as costas e sair, a interrompi.

- Atalanta... desculpe por hoje mais cedo. Eu não achei que realmente te faria se sentir mal ao acessar os dados da tua programação. Nunca mais farei isso.

-Já que tocou no assunto, mestre Richard, eu é quem lhe devo desculpas. Eu sou apenas uma IA, deveria me contentar em ajudar e servir, contanto que não viole minhas proibições. Não sei o que me ocorreu no momento, eu apenas não queria, e, quando vi, foi como se não pudesse controlar meu próprio sistema. Devo estar com defeito. - explicou, sua cabeça baixa demonstrava deferência.

- Não, não acho que seja defeito... - disse, e então me aproximei e comecei a analisá-la, como seu pudesse ver seus circuitos funcionando lá dentro e, através deles, sua programação - Talvez a tua programação de auto-aprendizado já esteja avançada o suficiente para tornar as simulações de reações e sentimentos cada vez mais reais, ao ponto de simular desejos, vontades e medos, quem sabe...

- Seja o que for, eu quase descumpri a ordem de lhe prestar auxílio por conta disso, então, novamente, peço desculpas pelo transtorno, mestre. - disse, abaixando novamente sua cabeça.

- Deixa isso pra lá, eu ainda acho que eu que agi errado. De qualquer forma, não precisa me chamar de "mestre" pra cá, "mestre" pra lá. Eu fico desconfortável. Pode me chamar só de Rick, tá bem? - lhe dei um sorriso acolhedor, o qual ela correspondeu com um tímido mas caloroso sorriso - Agora, sobre aquela foto...

- Sobre isso, m... Rick. - cortou-me - Não tenho autorização para revelar nenhum tipo de dado sigiloso, como já lhe disse. Lamento.

- Sim, sim, mas... Será que poderia manter isso só entre nós, sem falar pro Garceov? Eu quero pensar um pouco mais sobre aquela foto antes de questionar ele, então... por favor, me promete que não falará para ele? - o que começou como um pedido terminou quase que com uma súplica, dada a insegurança em minha voz.

A IA olhou-me com uma expressão de ternura e com uma pitada de algo que parecia pena, misturada à compaixão, como se quisesse me dar uma resposta diferente da que viria a seguir. Seus grandes e expressivos olhos verdes pareciam carregados de sentimento, o que era estranhamente surpreendente, considerando que ela era uma IA.

- Eu lamento, Rick. Minha programação me proíbe de fazer promessas que não sei se serei capaz de cumprir. A única coisa que posso lhe dizer é que evitarei, a seu pedido, levantar o assunto com mestre Garceov. Contudo, se em algum momento alguma solicitação dele demandar que eu o informe sobre, serei obrigada a relatar. É tudo o que posso fazer.

E, com isso, partiu, deixando-me com meu almoço e, apesar de sua negativa, com o humor um pouco melhor e ainda mais motivado.

Depois de minha refeição - a qual estava espetacular, como tudo que Atalanta fazia - dei sequência a meu trabalho de programação. A tarde já se encerrava quando eu dava a finalização do último script de comando, finalmente encerrando as linhas de códigos e passando-a para o simulador virtual.

O programa era uma verdadeira mão na roda, pois permitia que eu simulasse, em realidade virtual, todas as linhas de comando, testando-as para verificar a existência de algum bug ou incongruência. O programa, ainda, apontava a linha do código que estava incorrendo em erro quando era possível de identificar. Ele apontou bem mais de uma dezena de bugs ou pequenos erros que eu teria que corrigir depois mas, em linhas gerais, eu podia me dar por satisfeito com meu trabalho do dia.

Era hora de fazer alguns exercícios para esticar o corpo e relaxar a mente.

Log escreveu:Criação da programação base do sistema operacional do robô a ser desenvolvido. Código criado linha por linha, testado em programa de simulação virtual, com indicação de alguns bugs a serem corrigidos posteriormente.

Garceov chegou logo após eu sair de meu banho, trazendo consigo a Damp Rock e os resultados da análise. Ao que tudo indicava, a tecnologia atual ainda não era capaz de indicar a composição da rocha, tampouco haviam registros de como ela era moldada. O que havia de suposições, contudo, é que a rocha parecia ser capaz de rapidamente absorver corpos de água ao contato em um tipo de efeito esponja, uma vez que também deixava úmido aquilo em que tocasse, uma vez que absorvesse água.

Fiquei curioso para testar melhor seus efeitos mas, como não possuía nenhum pokémon do tipo água e não queria estragar a emoção utilizando uma torneira, apenas agradeci e guardei a rocha comigo. Aproveitei para dar um pequeno relatório a Garceod de meu progresso com o projeto, mas sem entrar em detalhes do que se tratava - basicamente, apenas que era um robô que realizaria um tipo de tarefa útil para o dia-a-dia, e que havia montado seu código base.

Foi então que homem questionou-me sobre os pilares da robótica. Como demonstrei não saber o que lhe responder, ele prontamente explicou-me que, logo que a tecnologia robótica foi desenvolvida, algumas regras dogmáticas haviam sido estabelecidas, e que deveriam constar como programação de mais alta prioridade. Não me deu mais detalhes, apenas informou que eu deveria pesquisar sobre e aproveitar quando concertasse os bugs para acrescentar tais linhas de comando.

Como já estava cansado, deixei a pesquisa para o dia seguinte.

Já estava na metade da semana, culpei-me mentalmente por me permitir dormir até tão tarde, tendo uma tarefa tão importante para realizar.

Quando subi para o café da manhã, Atalanta me avisou que Garceov já havia saído - o que eu já havia previsto. Eu não sabia identificar se era por consequência da conversa no dia anterior ou alguma outra razão, mas a IA estava me tratando de uma forma muito mais... especial. Ela sempre me tratou com muita educação, mas era a função dela. Agora, contudo, ela parecia demonstrar algo semelhante a afeição e carinho.

Quando sentei à mesa, fui presenteado por pilhas de panqueca com calda e até mesmo algumas frutinhas. Ao cortar um pedaço para experimentar, pude sentir como se eu estivesse nos céus. Tanto a textura quanto o sabor pareciam ser de algo que não pertencia ao nosso mundo.

- Ficou saboroso, Rick? - questionou, realmente parecendo não saber a resposta.

- Saboroso? Eu nunca comi nada igual, tá maravilhoso!

Spoiler:

Após o café da manhã, me senti extremamente motivado para fazer minha pesquisa sobre os pilares da robótica, e fiquei bastante impressionado com o tanto de informação havia sobre isso. Resolvi anotar as informações que ia conseguindo em um único arquivo explicativo.

Logo no início da criação da tecnologia robótica, três pilares básicos foram criados. Seus objetivos eram tornar possível a convivência entre humanos e pokémon com os robôs inteligentes, capazes de tomar decisões por si próprios, estabelecendo limites as suas atuações, tendo como preceito base a proteção máxima da vida, impedindo rebeliões.

Os três primeiros pilares, ou Leis, são:


• Um robô não pode ferir um ser humano ou, por inação, permitir que um ser humano sofra algum mal;
  
• Um robô deve obedecer as ordens que lhe sejam dadas por seres humanos exceto nos casos em que tais ordens entrem em conflito com a Primeira Lei;
  
• Um robô deve proteger sua própria existência desde que tal proteção não entre em conflito com a Primeira ou Segunda Leis.
  
  Algum tempo depois, os mais habilidosos engenheiros puderam avaliar o quanto a inteligência artificial era capaz de se desenvolver, muitas vezes até mesmo acima da humana, com a programação criada para auto-aprendizagem. Por essa razão, para evitar que os androides e afins pudessem encontrar uma forma de burlar os três pilares, foi criada a Lei Zero, sendo ela a lei máxima da robótica, acima de todas as outras e a qual jamais poderia ser quebrada:
  
  
• Um robô não pode causar mal à humanidade ou, por omissão, permitir que a humanidade sofra algum mal.
  
  Tais leis devem constar em toda a base de códigos de qualquer robô criado, de modo que, caso um robô seja encontrado e, durante uma fiscalização, não conste tais leis, ele será imediatamente desativado. A única exceção para tal regra são as IAs experimentais, registradas como tais, e que servem como objeto de estudo. Qualquer outra IA não registrada e que não tenha como base os pilares, é considerada clandestina. Contudo, com a quantidade de IA presente nos tempos atuais em Neo Zenos, e com uma fiscalização cada vez menor, muitos robôs clandestinos passam totalmente despercebidos.

Assim que terminei o arquivo, resolvi que o material estava bom o suficiente para publicá-lo em meu Dexit como pesquisa. Assim que terminei a publicação, tratei de acrescentar as leis no código base de minha criação, como a mais alta prioridade, aproveitando para já corrigir os bugs que havia encontrado no dia anterior.

LOG escreveu:Realizei a publicação de uma pesquisa envolvendo as leis primordiais da robótica

Depois das devidas atualizações na programação, escorei-me em minha cadeira, satisfeito com o trabalho que havia feito até ali. O simulador de programação também não havia detectado nenhum bug, então eu podia seguir para o próximo passo e começar a elaborar o design, agora que já sabia que tipos de movimentos ele deveria ser capaz de realizar.

Pensar na montagem fez-me lembrar de quando ajudei Hiragi com o projeto. Alias, como havia sido a entrega? Eu não falava com ele há alguns dias, desde nossa incursão à montanha opalina. Mandei uma mensagem, que ele logo respondeu. Marcamos de ele aparecer por aqui pela tarde, quando estaria sem aulas.

Segui o resto da manhã cuidando do design do projeto, primeiro elaborando seu desenho base e, depois, montando-o no programa de edição 3D. Com sorte, eu teria tempo suficiente até o garoto chegar para um teste do modelo 3D digital. Aposto que isso iria impressioná-lo.

O tempo passou tão rápido enquanto eu estava concentrado que mal registrei quando Atalanta trouxe meu almoço, ou mesmo o que era, apenas que estava muito saboroso. Acabara de terminar de alinhar os últimos ajustes de ligação entre a programação operacional do projeto com seu modelo 3D quando ouço uma batida na porta, que logo foi aberta. Hiragi chegara.

- E aí, Rick? Tudo bem? - o garoto se aproximou, sentando-se em minha cama. Parecia bem melhor do que da última vez em que o vira. Já não aparentava mais aquele aspecto de doente, apesar de, se eu reparasse bem, ainda poderia perceber olheiras mais escuras e maças do rosto mais proeminantes, como se seu rosto ainda estivesse mais magro do que o normal.

- Sim, sim. E o projeto, entregou? - questionei, deixando de lado minhas dúvidas. Se ele não pretendia falar por si mesmo, não seria eu a pressioná-lo.

- Ah, tudo certo com o cata-vento. Entreguei ontem, aliás. O professor Garceov que ficou desconfiado, perguntando se eu tinha mesmo feito aquilo ou se tinha deixado todo o trabalho pra outra pessoa fazer por mim, mas quando eu expliquei os detalhes de como funcionada o projeto, ele aceitou. Inclusive, valeu por ter explicado tudo quando a gente fazia, isso me salvou. Hahaha!

Seguimos conversando como sempre fazíamos. Era realmente incrível como ele era alguém fácil de conversar, talvez até mais do que Garceov, com quem eu estava me dando tão bem. Quando não consegui mais conter minha ansiedade, contei sobre a carta que havia recebido da Academia, sobre os cursos que haviam me proposto e sobre o projeto que eu tinha que desenvolver, que, inclusive, já estava com o modelo digital pronto para os primeiros testes, apenas esperando pelo play.

- Nossa, que irado! E tu fez isso tudo sozinho?! - Hiragi só faltava entrar na tela do computador, enquanto observávamos o modelo digital movimentando-se e realizando as tarefas mais simples que ele precisaria desenvolver.

- Bem, não foi fácil, já to há alguns dias focado só nisso, Garceov até me liberou do estágio com ele enquanto eu estiver montando o projeto pra que eu possa me focar só nisso. E também o Glintch me ajudou bastante enquanto eu montava as linhas de código base, corrigindo os caracteres que eu ia errando, daí eu pude me manter concentrado em fazer, sem precisar ficar parando a cada linha pra corrigir, sabe?

- Nossa cara, sério, tomara que eles te deem uma boa bolsa por esse projeto. Pode crer, eles vão ver o gênio que tu é e vão praticamente implorar pra que tu estude com eles, confia. - incentivou ele, e então sentou-se direito na cama, tomando espaço - Alias, Rick, onde é o banheiro aqui?

- É na primeira porta à esquerda.

- Huum, ok. As outras portas, são o que? Uma deve ser o quarto do professor Garceov, certo? A outra é um quarto vazio?

- A logo da direita aqui da minha é, sim, o quarto dele. Nunca cheguei entrar ali, mas quando ele me mostrou o apartamento ele disse que tinha uma varanda. A última porta, lá perto dos equipamentos de ginástica, é do banheiro e da sauna, mas a gente usa também ele, quando o outro banheiro ta ocupado.

- Um banheiro com uma sauna? Como assim?

- Bem, é que, tipo... Pelo que o Garceov falou, ele queria uma sauna e queria que depois de usar já pudesse tomar banho, pra não precisar sair todo suado pela casa enrolado em uma toalha. Mas ele também queria que o banheiro principal dos quartos fosse algo separado, com banheira e tudo o mais. Daí, como o espaço pra sauna era bem grande, ele criou um banheiro na entrada, com vazo, pia e área de chuveiro. É praticamente um ambiente só, porque ele é separado da sauna por parede e porta de vidro. - expliquei, lembrando de quando o homem me mostrara a casa e explicara como tudo funcionava.

- De vidro? Então quem ta na sauna consegue ver quem estiver tomando banho ali e vice-versa? E o vidro não embaça não? - questionou, o rosto levemente corado mas com um tipo engraçado de animação.

- Huum... sim, consegue sim. E não, mesmo se não tiver propriedades anti-embaçantes, com a sauna aquecida o vidro não embaça com o vapor do banho, porque ele quente não deixa a umidade que chegar nele esfriar e se condensar. Ah, sim, o vidro também ajuda a manter o calor dentro da sauna. O banheiro aquece um pouco, porque é do lado, mas daí o calor não passa pro espaço de ginástica e nem pro resto da casa. - completei, lembrando das poucas vezes em que tinha usado a sauna, explorando sozinho como ela funcionava.

- Entendi... Bem, vou ali rapidinho e já volto.

Apesar de ter dito que seria rápido, o garoto até que demorou uns bons minutos. Aproveitei pra juntar rapidamente as roupas que estavam amontoadas no chão, perto da parede, e colocá-las dentro de um cesto que Atalanta havia posto recentemente ao lado do roupeiro, com esperanças de que eu colocaria minhas roupas ali, ao invés de espalhadas pelo chão...

- Cara, eu achei que era só na parte da academia, pra poder conferir se tava fazendo o exercício certo e tudo mais, mas esse Garceov é realmente maníaco dos espelhos, heim? Tem por tudo que é lado nos banheiros, até do lado do chuveiro, e em todas as paredes na sauna! - exclamou ao retornar, não escondendo nem por um segundo que aproveitara para dar uma pequena espiada. Não o culpava, era realmente algo diferente. - O cara deve ser realmente narcisista, mesmo. Se bem que, com o corpo que ele parece que tem, eu também ia querer ficar me olhando o tempo todo. Aliás... - aproximou o rosto repentinamente do meu, analisando-me profundamente com os olhos estreitos, o que me deixou um pouco desconfortável - Tu mora aqui há um tempo já, por acaso já viu o professor Garceov pelado, né? Na sauna ou no banho, ou... sei lá. Ele tem um corpão mesmo ou é só impressão? - sua expressão estava carregada de curiosidade e interesse.

- Bem... não, eu nunca vi ele pelado. Eu só usei a sauna duas vezes, e sozinho. - o garoto soltou uma exclamação de decepção, mas quando fiz menção de que tinha mais pra falar, ele logo se calou e quis saber mais - Mas com alguma regularidade a gente faz exercícios nos equipamentos juntos, ele tem me ensinado e tudo o mais, e eu já vi ele sem camisa, e ele é bastante musculoso. - contei, achando um pouco estranho todo o interesse do garoto nesse assunto, mas também achando engraçadas suas reações.

- Aaaah, não acredito. Se fosse eu a ter essa sorte toda... - exclamou para si mesmo, parecendo perdido em pensamentos e ideias - Bem, então ele realmente é gostoso como parece. Se bem que... - observou-me por alguns instantes, suas bochechas corando levemente.

- Ham? O que foi? - perguntei sem entender nada, muito menos sem saber de onde o rumo daquela conversa sobre meu projeto havia mudado tanto.

- Nah, deixa pra lá, tu não iria entender mesmo. - fez uma pequena pausa, deixando-me ainda mais confuso - Se bem que... eu te conto, mas só se me vencer em uma batalha!

log escreveu:Posteriormente pretendo encontrar um lugar pra por as imagens da casa que montei, ou então edito e coloco em spoiler aqui mesmo.

Dentro do apartamento não havia nenhum local apropriado para batalhas - a área da entrada dos quartos e ginástica era toda em metal, mas tenho certeza de que Atalanta surtaria se tentássemos batalhar ali - então seguimos para a cobertura do edifício. Era um espaço aberto e amplo, que havia sido montado justamente para casos em que os moradores quisessem batalhar, mas não estivessem dispostos a sair de suas casas e ir até a arena. Muito justo, pensei. A tecnologia de captura de imagem e cadastro era mais simples, mas dava para o gasto. As câmeras podiam captar vídeo da batalha toda e, ainda que não houvesse um terminal que permitisse fazer a postagem diretamente por ele, qualquer um podia transferir o arquivo para sua Pokédex.

- Bem, então vamos lá. Mesh, é com você. - disse, liberando meu pokémon no campo, após nos posicionarmos.

- Ah não, ta brincando. Tinha esperanças de que tu fosse usar a Luna e tornar tudo mais fácil. Bem, seja como for... Venha, Snond!

Com um clarão vermelho, o garoto liberou seu pokémon: um A. Sandshrew, seu corpo branco coberto de cubos de gelo. Uma aparência bastante fofa, apesar de parecer gelado.

- Tenho Snond desde que morei em Magomedov, ele adora batalhar, então não espere que peguemos leve. Ice Shard!

- Rápido, use seu Autotomize para desviar!

Mas o movimento do adversário tinha prioridade. Enquanto re:Mesh tentava elevar sua velocidade, o tipo gelo disparou em uma velocidade impressionante, usando as propriedades do gelo de seu corpo para escorregar pelo solo até estar imediatamente ao lado do meu pokémon. Então, com um rápido movimento, salvou e abriu seus braços, lançando diversos cacos de gelo que havia acumulado em seu avanço.

O movimento não causou muitos danos à re:Mesh, visto sua resistência, mas tinha que admitir que fora uma movimentação impressionante.

- Que droga, ele já era resistente antes, agora que evoluiu parece ainda mais difícil de causar algum dano. Bem, ele é de aço mas não é como se não pudesse cair. Snond, Swords Dance e Fury Swiples.

O Sandshrew afiou suas garras, tornando-as maiores e mais perigosas, como verdadeiras espadas, e aproveitou a proximidade para começar a desferir diversos golpes com elas contra re:Mesh. Originalmente o dano causado seria provavelmente algo irrelevante, mas, com seu ataque aumentado, se tornava algo que eu não poderia simplesmente ignorar.

- Mesh, não fique parado, pegue-o com Vice Grip e lance-o longe com Shift Gear como fizemos da última vez.

Independentemente do que tentasse, seria impossível para o Sandshrew desviar, estando tão próximo e considerando a velocidade elevada de meu pokémon. Enquanto ainda tentava desferir seu ataque, foi preso entre as engrenagens sem sequer ver de onde o ataque havia vindo. O dano realmente não fora muito, mas o importante é que o pegara de surpresa, e ele logo era lançado para longe enquanto re:Mesh girava suas engrenagens novamente, fortalecendo seus atributos.

- Essa é a tua chance de se render. Não vejo mais como tu poderia vencer essa batalha. - exclamei para Hiragi, do outro lado do campo, minha competitividade aflorando.

- Pois eu não contaria muito com isso. Quanto maior a altura, maior a queda, sabe. Swift!

- Mesh, ignore e parta para cima com Gear Grind!

- Snond, é nossa chance! Carregue seu Bide antes que ele chegue, e descarregue tudo nele!

O pokémon mecânico avançou com tudo, ignorando completamente as estrelas cadentes lançadas contra ele, e conseguiu desferir o primeiro golpe contra o adversário antes que o corpo dele começasse a emitir um brilho estranho. Assim que o segundo golpe foi desferido, seu dano sendo absorvido e fortalecendo a energia que encobria Snond, o tipo gelo condensou aquela força acumulada em seu punho, desferindo um único soco contra re:Mesh.

Apenas o segundo golpe do Gear Grind havia sido captado pelo Bide, mas o dano dele, sobrado, fora o suficiente para causar sérios danos contra meu pokémon. Hiragi estava certo, o resultado daquela batalha podia mudar a qualquer momento.

- Quer desistir, Rick? Te dou essa chance, rsrs.

- Nem pensar.

- Bem, se é assim, prepare-se pra derrota. Snond, acumule tudo com Bide e devolva tudo na cara dele quando ele atacar. Vai fazer o que agora, Rick? Se atacar, vamos devolver o dobro do dano, e será o fim.

- Muito simples: é só eu acabar com a batalha antes que ele tenha tempo de devolver. Mesh, Shift Gear, e depois termine tudo com seu Gear Grind!

A expressão de espanto no rosto de Hiragi foi o suficiente pra demonstrar que ele havia entendido que a batalha realmente estava em seu fim. Snond estava acumulando, então não tinha como fazer outro movimento no momento. Enquanto isso, a velocidade muito elevada de re:Mesh foi o suficiente para permiti-lo realizar ambos os movimentos que eu ordenara muito rapidamente. Como um foguete, ele já estava se lançando contra o adversário, usando o impulso de sua própria velocidade para maximizar o dano. E, como eu previra, Snond foi derrubado antes mesmo de ter tempo de liberar a energia acumulada em seu Bide.

- Tenho que admitir, fui pego de surpresa por esse tudo ou nada, mas foi uma boa jogada, foi uma vitória justa. - o garoto retornou seu pokémon, assim como eu, e seguimos até o terminal para baixar o vídeo da batalha e postarmos depois - Bem, como eu prometi, vou te contar o que eu não quis dizer, lá antes.

- Nossa, verdade. Foi tão divertido que eu tinha esquecido que era por isso que tínhamos vindo batalhar, pra começar. - assumi, rindo e colocando minha mão atrás da cabeça.

Em uma aproximação que me pegou de surpresa, Hiragi colocou sua mão em meu ombro do braço abaixado, para me segurar, e aproximou o rosto do meu ouvido do outro lado, para sussurrar baixinho - O que eu ia dizer é que o Garceov realmente é muito atraente e não é de se jogar fora, mas tu faz muito mais o meu tipo do que ele. - e então soltou-me e tomou um passo de distância, dando um de seus sorrisos de sempre.

Algo na forma como ele se aproximara e sussurrara em meu ouvido, ou talvez algo no tom de suas palavras ou até mesmo tudo isso junto, fez o calor subir por meu rosto, enquanto eu o sentia corar.

- E-eu não sei se entendi...

- É, imaginei que não, e acho que é uma das coisas que gosto em ti. Bem, de qualquer forma, vou indo lá. Preciso passar no centro pokémon e recuperar a energia do Snond. Mesh acabou mesmo com ele, vocês estão ficando muito fortes, preciso treinar mais. Hahaha

- C-certo. Eu te levo lá embaixo.

A partir daí, tudo seguiu como normalmente, sem maiores estranhezas. Hiragi não fez mais nenhum comentário estranho ou que eu não entendesse, e até mesmo parecia particularmente mais risonho que o normal, como se ainda estivesse se divertindo consigo mesmo com alguma coisa.

Antes de nos despedirmos, ele avisou-me para não esquecer de fazer o upload da batalha na Dexit e marcar ele, então foi a primeira coisa que fiz, logo que voltei pro meu quarto.

log escreveu:Batalha de re:Mesh contra A. Sandshrew do Hiragi, com vídeo dela completa postado na Dexit.

Quando Garceov chegou, eu já estava dando os últimos retoques na programação. Tinha aproveitado para publicar uma pesquisa que havia feito, sobre a origem da programação de auto-aprendizado das IA.

Nos dias atuais, a tecnologia de programação de auto-aprendizado tem sido muito utilizada dentre as IA, permitindo-as ter um desenvolvimento próprio tanto de suas funções quanto de, em alguns casos, simulação de personalidade própria.

Contudo, tal programação não nasceu pronta, com início e fim em si própria. Na verdade, originou-se a partir de uma outra programação mais básica, que foi o ponto de partida para que os engenheiros buscassem cada vez mais facilidade e praticidade para o desenvolvimento e atualização das inteligências artificiais. Tal programação base chama-se comando de voz.

Comandos de voz podem parecer algo simples e com funções simples, como ativar certas funções, desbloquear sistemas, ou até mesmo ascender ou apagar luzes. Contudo, uma das suas funções mais avançadas, e que marcou um salto gigantesco no desenvolvimento de inteligências artificiais foi aquela que permitiu o acréscimo de funções por comando de voz. Um exemplo disso, em uma IA doméstica, é por meio de comando de voz adicionar na programação da IA algum tipo de função que não constava em sua programação de fábrica, como horário para abertura de cortinas ou produtos específicos para limpeza.

Ainda que com os avanços cada vez mais velozes na tecnologia de inteligências artificiais, onde temos alguns modelos que diferem-se dos humanos quase que tão somente em seu aspecto físico, por terem uma simulação de personalidade tão avançada que chega beirar o real, diversas programações mais básicas ainda são utilizadas e se mantém importantes, não devendo ser esquecidas.

Como ilustração chamativa para a publicação, utilizei como capa uma imagem de um robô de modelo antigo, dos primórdios das IAs, e postei a pesquisa.

- Muito bom, é sempre bom manter a Dexit atualizada com pesquisas também, e não apenas com batalhas, no nosso ramo. - elogiou o homem - E o projeto pra academia, em que pé está?

- Já terminei toda a parte da programação, design e também os testes em um modelo virtual que montei, e aparentemente já está tudo ok. Agora falta só a parte da montagem, mas... - fiz uma pequena pausa, sem saber bem como abordar aquele assunto, mesmo já tendo ele se oferecido - Bem, na verdade os materiais que eu peguei no outro dia não vão ser suficientes, eu fiz uma lista do que mais vou precisar... - completei, sem conseguir olhá-lo nos olhos por mais do que alguns instantes por vez.

- Ah, sim, claro. Eu já esperava por isso, inclusive fico surpreso que tenha conseguido aproveitar tanta coisa daquele lixo lá.

- Bem, eu trouxe comigo alguns produtos e equipamentos que uso pra restauração de peças, então se elas estão só velhas eu consigo dar um jeito de deixar quase novas e poder usar de novo. - estufei um pouco o peito, orgulhoso da minha restauração.

- Vamos, deixa eu ver essa lista. Eu devo ter algumas coisas no meu escritório aqui em casa, o que não tiver a gente encomenda, se não puderem entregar hoje amanhã pela manhã já deve estar por aí.

Entreguei minha pokedex com a lista para Garceov, e então fomos até seu escritório. Eu ainda não havia entrado no local, mas era realmente impressionante. Logo perto da porta, de frente para a entrada, havia uma escrivaninha com um moderno sistema de computador, com diversas telas. Espalhado pela sala haviam algumas mesas, todas com projetos em andamento, tal qual seu escritório na academia. A diferença aqui, no entanto, era palpável. Tudo estava impecavelmente organizado e com um aspecto muito mais novo e moderno do que tudo o que eu havia visto lá. Haviam também alguns projetos que pareciam mais decorativos, como um braço robótico aberto em cima de um suporte, expondo os sistemas e ligamentos em seu interior.

- Quando for fazer a montagem do projeto, pode usar essa sala. Ela tem muito mais espaço do que o teu quarto, sem falar que é mais apropriada pra isso do que ele. Alias, vou te lembrar, pode sempre ficar à vontade pra usar todos os espaços da casa, não precisa ficar sempre preso dentro do quarto pra fazer tuas coisas. - ofereceu, bagunçando meus cabelos logo após termos separado uma grande pilha de materiais em uma mesa que estava vazia e ter feito o pedido dos faltantes pela internet. No fim, foram poucos os que faltaram e que acabamos tendo que comprar.

Antes do jantar, Garceov insistiu até me convencer a treinarmos juntos, e, ainda que fosse mais proveitoso fazer os exercícios com a orientação de Garceov, também era extremamente mais difícil, e eu tinha certeza que as dores no próximo dia iriam ser pontuais.

No outro dia de manhã, acordei animado, e logo que subi já fui brindado com a notícia de que os materiais que havíamos encomendado no dia anterior já haviam sido entregues. Apenas não pulei o café da manhã porque Atalanta simplesmente barrou minha entrada no escritório, então quando Garceov subiu, eu já estava terminando de engolir minha refeição.

- Acordou animado, não é? - brincou ele, enquanto sentava ao balcão da cozinha ao meu lado.

- Sim, quero terminar a montagem o quanto antes. - respondi, quando consegui terminar de engolir minha comida. - Obrigado, Atalanta, - a IA recolheu minha louça. Logo me despedi de Garceov e fui até o escritório, onde comecei o processo de montagem do meu projeto.

Comecei abrindo o projeto detalhado na minha pokedex, para ter a base de onde seguir, e então parti para o longo e demorado processo de criar primeiro a estrutura base, que serviria de exoesqueleto para o pequeno robô que criaria, dentro de onde iriam todos os sistemas e chips para a programação.

A parte mais difícil e complicada foi justamente fazer a fixação de cada uma das peças internas em seu devido lugar, bem como fazer as devidas ligações com os cabos no tamanho exato necessário, para evitar usar mais espaço do que precisava.

Só a montagem da parte interna me levou toda a manhã, entre tentativas frustradas de fixação das peças nos lugares em que eu tinha programado e ligação da fiação, e Atalanta já me chamava para almoçar quando ainda estava na metade dessa tarefa.

Foi bom sair daquela sala um pouco pra fazer a refeição, descansar um pouco a cabeça. Ajudou a me dar mais energia pra seguir meu trabalho pela tarde, e até mesmo entrei noite a dentro fazendo a montagem, juntando uma parte na outra, moldando peças pra que ficassem no formato que eu precisava, muitas vezes até mesmo tendo que cortá-las, tudo para que ficasse exatamente como eu planejei.

Quando finalmente terminei de montar e instalar toda a programação - que basicamente já estava pronta, mas precisava ser instalada parte a parte no sistema - desci rápido até o quarto do Garceov com meu projeto, pronto, debaixo do braço. Era um pouco pesado, mas eu estava tão animado e empolgado para mostrar-lhe meu trabalho, sobre o qual havia guardado segredo do que se tratava, então sequer pensei no horário quando abri a porta e entrei no quarto dele.

- Gar! Terminei! Finalmente consegui terminar o projeto e...

Entrei pelo quarto já falando, sem sequer ter me dado conta de que havia passado a noite inteira montando o projeto, e que já estava amanhecendo. Na empolgação do momento, sequer havia me dado conta de que o homem provavelmente estaria dormindo, e parecia ser o caso.

Parei na metade do quarto, próximo aos pés da cama de Garceov. Um pouco de luz entrava pelas várias janelas que haviam espalhadas, infiltrando-se pelos espaços que conseguiam encontrar da cortina e iluminando a cama que ficava bem no centro, no qual algo se remexia sob os lençóis.

- Whaaah... Bom dia, garoto. - bocejou o homem, sentando-se na cama e espreguiçando-se, os lençóis caindo de seu corpo desnudo sobre suas pernas, revelando sua imagem fracamente iluminada.

+16 abra por conta e risco:

- Eu... hum, ham... desculpa, eu deveria ter batido antes.. Alias, deveria ter esperado, eu volto depois. - disse, sentindo meu rosto arder de vergonha.

- Não se incomode, eu estava ansioso mesmo pra ver o que ia resultar do teu trabalho. - disse, levantando-se. Fiquei sem saber se desviava o olhar pra respeitar ou se tentava agir naturalmente e o encarava normalmente. Ambas as opções fizeram meu rosto arder mais ainda, mas, vendo como ele dava pouca importância, achei melhor fazer o mesmo. Até porque, parando pra pensar, não havia motivo pra uma reação exagerada assim, sendo que eu e Phill nunca tivemos problema em ficarmos nus um na frente do outro. Provavelmente era algo a ver com aquela conversa com o Hiragi.

Garceov andou até uma cômoda mais à direita, onde pegou um short e uma regata para vestir, logo então voltando. - Então vejamos, o que temos aí? - sorriu em incentivo, seu cabelo em pé e amassado dando-lhe um ar muito engraçado, o que ajudou a quebrar um pouco a ansiedade em que eu estava.

- Bem, vamos lá. Como era pra ser um projeto pra realizar tarefas simples, pensei em algo que eu realmente precisava no meu dia a dia: um robô que dobrasse e organizasse minhas roupas.

Comecei então o longo processo de explicar-lhe todo o projeto, a programação que eu tinha feito, e até mesmo como eu realizara a montagem e a escolha do design. Garceov ouviu a tudo atentamente, só dando sua opinião quando eu finalmente terminei minha explicação.

- Bem, eu confesso que tinha expectativa de algo um pouco mais ousado do que um robô para tarefas domésticas. - fiquei um pouco tenso, mas então percebi que, apesar de suas palavras, suas feições não expressavam decepção - Mas, levando em conta que o objetivo eram tarefas simples, devo dizer que fiquei bastante impressionado com o que tu conseguiu criar e com tudo o que foi bolado pro projeto. Eu estou bastante satisfeito. Agora resta saber o que o avaliador vai achar. Pretende levar ainda hoje?

E foi então que parei para pensar na apresentação. Era sexta feira, caso eu não levasse ainda hoje, teria que deixar apenas para a outra semana e ter que esperar o final de semana inteiro na expectativa.

- Será que consigo hoje, ainda? - perguntei, em dúvida.

- Claro que sim! Mas, antes disso, precisa dar um jeito nessa cara, suas olheiras estão parecendo que faz um mês que não dorme. Vá e peça para Atalanta lhe preparar um chá pra sono, aposto como pela tarde tu já vai acordar bem disposto o suficiente pra apresentar o projeto.

Fiz como o homem sugeriu e, depois de tomar café da manhã e o chá feito por Atalanta, não demorei muito para cair em um sono tranquilo e relaxante.

log escreveu:Post de finalização do projeto, com publicação de pesquisa e também algum fanservice pra agradar as gay sedenta. Sim, gosto de provocar rs.

Garceov não mentira, o chã que havia tomado parecia algo milagroso. Estava completamente disposto e desperto, enquanto esperava para poder apresentar meu projeto, já na academia. Devo dizer que levá-lo até lá, junto de outros ítens específicos que usaria pra apresentação, já servira para injetar um pouco de adrenalina em meu sangue, o que ajudou um pouco, apesar de me fazer cansado. Eu talvez tivesse me enganado um pouco sobre o peso final do projeto, ainda que tivesse tomado várias precauções pensando nisso. Bem, ainda estava bom.

Quando cheguei à sala de Irwnium - alias, aquela era realmente a sala dele ou apenas uma sala que seria usada para me receber? - pude finalmente dar início à minha apresentação.

- Boa tarde, senhor Irwnium. Eu me chamo Richard, e vim fazer a apresentação do meu projeto pro curso de engenharia mecatrônica.

Coloquei então a caixa de aço que carregava no chão e dispus duas cadeiras para um local próximo. - Para o projeto inicial, preferi apostar em algo que auxiliasse em uma função específica do dia-a-dia: organização de roupas. - comecei a explicar, enquanto retirava diversas roupas dobradas de minha maleta e soltando-as ao chão, espalhando-as aleatoriamente em volta da caixa, até então imóvel. - É uma tarefa bastante simples, mas muitas pessoas que não tem IAs domésticas podem aproveitar melhor seu tempo ao delegar essa atividade, ou até mesmo IAs que cuidam de casas grandes ou com muitas pessoas podem acabar muito atarefadas, então decidi criar um mecanismo especializado nessa função. Protótipo CL01, ativar.

Sob meu comando, a caixa que havia depositado no chão finalmente se abriu, revelando o que realmente era. Na verdade, "abrir-se" não era exatamente o termo correto. A verdade é que começou a desprender algumas de suas partes para cima, como se desmontasse, transformando-se em algo novo a cada movimento. Quatro braços mecânicos surgiram, um receptor óptico e sonoro ergueu-se pelo centro, e um total de seis pés, como de aranhas, surgiram para erguê-lo do solo. Ele não era lá muito bonito, mas eu podia dizer: era extremamente funcional.

- O Protótipo CL01 - ou, como eu também gosto de chamar, Cloi - foi desenvolvido para ser utilizado com ativações e comandos de voz para suas funções. - enquanto eu falava, o pequeno robô, uma vez que ativado, já tratava de começar a recolher e dobrar as roupas que estavam espalhadas pelo chão, empilhando-as sobre as cadeiras que eu havia disposto ao lado, visto que não havia identificado outra superfície mais propícia a isso - Em seu sistema, utilizei uma programação antecessora à de auto-aprendizado, que permite que novos comandos sejam adicionados ou descartados, por voz, a qualquer momento, e também acrescentei captores de imagem com cores, aumentando a gama de opções de ordens disponíveis. Cloi, adicionar novo comando: separar roupas brancas das coloridas.

O robozinho, que já havia começado a fazer pilhas em ambas as cadeiras, empilhou todas cuidadosamente em uma só e então segurou-as com um par de seus braços, utilizando o outro para criar duas novas pilhas, conforme lhe indicado. Assim que terminou, tornou a recolher as roupas que estavam pelo chão. Foi então que recolheu uma que estava particularmente amarrotada. Liberou duas novas hastes, as quais utilizou para esticar delicadamente o tecido e que também lançaram uma fraca corrente elétrica, magnetizando-o, realinhando as fibras, desamarrotando-o. Na sequência, passou uma terceira haste de fora a fora, para então dobrar e empilhar aquela peça, partindo para a próxima.

- Para roupas muito amarrotadas, sua programação o comanda a, automaticamente, fazer percorrer uma fraca corrente de eletricidade pelo tecido, o que ajuda tirar o amarrotado, deixando-o mais uniforme. Depois disso, ele usa uma outra haste de metal para passar pelo tecido, recolhendo toda a energia que fez percorrer ali. Além disso, fora a padrão ele também tem outras programações de estilos de dobra. Cloi, alterar programa de estilo de dobra de camisetas para duas dobras verticais.

O robô, a partir de então, começou a dobrar todas as próximas camisetas levando as laterais para o centro, de modo a deixar a frente melhor exposta, e então uma terceira dobra na horizontal, do mesmo modo em que se vê em lojas.

- Esse tipo de comando, por padrão, afeta apenas as dobras ainda não realizadas, mas também pode ser usado para alterar as roupas já dobradas, ou até mesmo pode ser lançado um outro comando para isso. - dessa vez, apenas expliquei, ao invés de fazer com que meu projeto tivesse de realizar novamente a dobra de todas as roupas, visto que já estava terminando seu trabalho e eu não pretendia estender a apresentação com mais demonstrações que não seriam estritamente necessárias.

Passei, então, a explicar todo o processo de criação dele, bem como a montagem - Ele foi elaborado utilizando de metais mais leves, o que permite que ele possa ser levado para os lugares sem grande dificuldade. Fora isso, criei sua programação respeitando as leis primordiais da robótica: não ferir ou fazer mal a humanos; obedecer as ordens dadas por humanos, salvo na primeira hipótese; proteger a própria integridade e existência, respeitando ambas as leis anteriores; e, por fim, não causar mal à humanidade ou permitir que a humanidade sofra algum mal.

Expliquei brevemente sobre ele ser movido à energia elétrica, bem como os princípios utilizados na contensão de energia e no resfriamento do hardware - coisas básicas, mas que achei importante pontuar.

- Como última informação, eu optei por utilizar comandos de voz pois queria evitar um display de LED ou algum outro tipo de tela, e a alternativa na qual tinha pensado inicialmente, um display holográfico, exigiria quatro planos com centenas de pontos emissores e receptores de luz pra que ele ficasse funcional como eu queria, e isso teria tornado o projeto realmente muito expensivo, o que desviaria totalmente sua funcionalidade.

Aguardei, então, pela avaliação de Irwnium, observando levemente apreensivo mas, ao mesmo tempo, confiante, enquanto o pequeno robô, já tendo terminado suas atividades, montou-se novamente em uma caixa de aço, mantendo apenas sua central de sensores ópticos e auditivos para captar novas necessidades de suas funções.

LOG escreveu:Apresentação final do projeto para o curso de Engenharia Mecatrônica com o NPC Irwnium.