[CL] Tripulação Raiders

A notícia repentina da noite passada deixou todos os atletas da divisão D com os nervos à flor da pele uma vez que finalmente teremos nossas habilidades aplicadas em campo, num jogo oficial de Pokématch. Minhas expectativas? São muito altas, é claro! Acredito que não só eu, como meus companheiros também, estamos todos num mix de empolgação e preocupação ao mesmo tempo. Empolgados porque depois de tanto treinamento nós vamos ter a chance de disputar contra outras equipes nesse campeonato regional da série D; preocupados porque nós da Team Raiders caímos diretamente contra os Bigs de Ylium, um time não só renomado por Neo Zenos, como também vão estar em casa. No universo dos esportes, uma equipe costuma ter muita sorte quando está jogando no seu próprio lar.

Nessa manhã a galera já estava no clima pra viagem, todos agilizando suas bagagens ao seu ritmo, mas no meio de tanta movimentação faltava a estima de alguém. Drew manteve-se calado desde que levantou, o que é estranho pois foi ele que na noite passada demorou a pegar no sono de tanta ansiedade.

— Ei cara, você tá bem? — Num lento levantar de cabeça ele me respondeu meia boca:
— É...

Não, isso não era usual. Numa tentativa de buscar por um canto mais privado, segurei pelo braço dele e o puxei para fora do quarto deixando nossas malas abertas sobre a beliche. Drew estava tão desconectado que só veio perceber a minha ação no meio do trajeto, assim, entramos apressadamente na antessala do banheiro para que pudéssemos conversar. Com o ambiente seguramente vazio, Drew descia sua mão até a bermuda e apalpando o bolso agarrava um volume que ele precisamente trazia para fora; uma pokéball.

— Jay Jay, só porque você é meu amigo... — Dizia com um certo pesar denunciando o que estava por vir — Eu tenho um probleminha com um pokémon... mas você não pode contar pra ninguém, valeu?

Fiquei calado, era todo ouvidos. Aquele prelúdio do depoimento seguinte era sério, ele me contava sobre ter um relacionamento complicado com um pokémon que possui um valor sentimental muito grande para ter que abrir mão dele. É um espécime que se recusa a obedecê-lo, mas que no passado, antes de evoluir, não era assim. Drew complementou dizendo que esse pokémon era de longe o seu mais poderoso e experiente até então, usá-lo nas partidas de Pokématch poderia ser de grande ajuda. Eu entendi de imediato a sua preocupação, para nós atletas dessa modalidade de esporte onde dependemos 70% dos pokémon, ter um parceiro que está em desarmonia consigo pode desestabilizar toda a partida e a equipe também. Nesse universo, vários esportistas já foram vexame de situações assim, então considerem como um dos piores pesadelos para os iniciantes que desejam alavancar o seu nome.

— Tenho medo que descubram e me tirem do time. Eu não quero sair, cara...
— Drew, relaxa, vamos tentar resolver isso, tudo bem? — Tentei acalmá-lo segurando sua mão. Em seguida sugeri que a gente fosse para o salão da academia, lá tinha um espaço mais apropriado para o que eu estava pensando.

Como já imaginava, a academia estava vazia, nenhum sinal de jogadores de qualquer divisão. Prontamente, pedi que o Drew liberasse o tal pokémon ao qual correspondeu com um sinal de receio, em ações lentas e que me deixavam transbordando em ânsia, segurou a esfera, pressionou seu dispositivo central e invocou a desordena criatura. Dos flashes materializava-se a nossa frente um ser que, quebrando todas as minhas expectativas, era diminuto e pouco intimidador. O corpo em sua maior parte esverdeado acompanhado da robusta corcunda que curiosamente exalava um cheiro delicioso, contrastava com a preguiçosa feição do lagarto roliço que para completar a graça tinha um capacete de meia maçã.

— Appletun! — Foi assim que a Pokédex o descreveu: Um Appletun. Um pokémon dragão que contra todos os estereótipos do seu tipo parecia mais uma criatura retirada dos contos de fadas. No primeiro instante eu confesso que me segurei para não rir, mais pelo fato de ter esperado algo mais... ameaçador? Mas consegui me conter. No primeiro contato já dava para perceber o quão diferente eles eram: Enquanto Drew tinha uma personalidade enérgica, Appletun, por outro lado, preferia se abster de qualquer coisa manifestando seu profundo desinteresse através de um ronco atrás de outro. — E-Ele está dormindo???
— É... É só isso o Fredo faz. Só come e dorme, o dia todo!!! — Alterou o tom da voz na tentativa de fazê-lo acordar, mas sem sucesso, recebeu apenas outra bufa em sequência. — Não sei mais o que fazer com esse daí... E mais, se fosse só o medo da Dona Coronela descobrir, mas não, ainda tem outra coisa: minha mãe. A gente vai pra Ylium cara, ela vai querer saber como está o Fredo e eu não vou ter onde enfiar a cara!!!

Pela história que ele contou, a sua mãe era dona de um dos poucos restaurantes em Ylium que ainda servem à moda clássica, ou seja, nada de androides ou tecnologia muito avançada, ela presa pelo calor entre as pessoas e a troca de interações proporciona isso; enfim, uma loucura. Vendo Drew ficar mais verde que o seu próprio Pokémon, eu só podia ajudá-lo se visse o Appletun em ação, se é que nesse estado ele vai ter essa proeza. Um rápido combate foi o que eu sugeri, de mesmo modo trouxe a recém capturada Corsola ao chão firme da academia.

— Ola? Hm... que estranho...
— Haha! Parece que eu não sou o único a ter problemas aqui, meu amigo... — De fato, estranhamente a Corsola não respondia ao meu chamado, ela se mantinha inerte em sua "forma de pedra" sem dar sinal de vida.
— Bom, que seja. Então já temos um motivo para enfrentarmos isso juntos!
— Certo Jay Jay, só não prometo jogabilidade com esse aí, valeu?

Com literalmente dois pokémon apáticos no campo improvisado, firmamos nosso compromisso num breve combate amistoso para testar ambas habilidades. Antes mesmo de qualquer um dar a voz, Appletun começou a bruxulear uma estranha luz enegrecida pelo seu corpo ainda em estado inerte. Drew apontou com desgosto a ação involuntária do pokémon e me deu a liberdade para seguir.

— Muito bem Ola, aproveite a guarda baixa dele e use o seu Ancient Power! — E mesmo com toda a determinação, nenhuma resposta me foi dada por parte da Corsola. Ela continuou oculta em sua casca esbranquiçada complementando o clímax depressivo que aquilo rapidamente acabou se tornando.
— Qual é Jay Jay, vai mesmo continuar com isso? Tipo, do Fredo eu já esperava essa reação, agora da Corsola... Aí você deu azar.

Mas ele estava errado, a luz que contornava Appletun crescia conforme as etapas de inutilidade se passavam, de algum modo a energia emanada por ele fez com que a Corsola saísse do seu estado de negação e se manifestasse na batalha lançando finalmente o aclamado Ancient Power. O pokémon coral invocou uma porção de cristais condecorados por uma aura roxa e num movimento rotatório impulsionava-os para o dragão preguiçoso. Os projéteis uniam-se conforme rotacionavam e tomavam a direção certa até atingir o alvo com sua força. Após as faíscas provocadas pela explosão se dissiparem, lá estava o Appletun intacto como se nada tivesse acontecido.

— Caramba... — Não sei se ficava impressionado pela resistência dele, ou pela misteriosa aura escura que, observando bem, parecia estar "enrijecendo" sua pele. Teria sido este o segredo para conter os danos?
— Não faço a menor ideia do que ele está pensando, mas quase sempre é a mesma coisa. — Comentou Drew acostumado com a reação do seu pokémon — Quer ver só? Aposto que agora ele vai usar Recover...

Dito e certo. O dragão abandonava o contorno sombrio para dar espaço ao véu luminoso que saía do cume de sua corcunda e espalhava-se pelo resto do corpo curando as poucas feridas que a investida da Corsola provocou. Nada surpreso, o loiro batia com a mão na cara e revirava os olhos, em seguida acionava a sua Pokéball como provocação de que para ele o combate não teria sentido.

— Espera! Você precisa entender o seu pokémon, Drew. Se deixar essa partida, estará perdendo uma oportunidade de colher mais dados sobre ele... — Minhas palavras o fizeram se manter firme.
— Tá, mas se demorar muito eu vou deixar pra lá, falou?!
— Tudo bem. — Voltei a atenção para a Corsola, ela estava tão concentrada no seu oponente que parecia estudá-lo com seus sentidos. — Ola impeça que ele use o Recover novamente, bloqueie o uso com Disable, em seguida avance com Tackle!

Dessa vez a Ghost-type me obedecia e arrancava um sorriso orgulhoso de mim. Os olhos fúnebres dela brilhavam conforme o corpo ganhava uma entonação lilás, noutro passo, Appletun também era acometido pela mesma reação corpórea indicando que o Disable está em efeito. Não por isso, o dragão continuou na mesma e agora voltava com sua misteriosa ação que emanava uma luz sombria. Analisei a Pokédex para saber quais movimentos essa espécie aprendia afim de tentar identificar que tipo de jogada era aquela.

— Poupe seu tempo, J.J. Esse é o Curse, um movimento que infelizmente eu não consigo retirar dele... — Explicou o atleta. — Ele prefere passar a partida inteira usando isso e se curando ao invés de atacar. Já estou farto desse loop!
— Hmm, então a energia sobrenatural do Curse despertou interesse na Ola, mas eu sinto que não é só isso...

De volta ao embate, Corsola analisava um ponto chave para executar sua investida, não que o oponente fosse se importar em desviar pois ele claramente não se incomoda, mas que algo naquela estratégia em se manter inerte meio que "não cheirava bem" - ainda que seja bem perfumado. Entre um salto e outro, Ola forjou uma tentativa para o seu ataque, não obstante, Fredo moveu suas narinas farejando a proximidade da adversária e como contra-ataque lançou do topo de sua corcunda uma fração de sementes sanguessugas que por muito pouco não atingia a Corsola.

— Ela tem mesmo bons reflexos — Pontuei.
— Ah é claro, o Leech Seed... Outro truque comum dele. VAMOS FREDO, ATAQUE CARA!

Com a quantidade de minutos que se passaram, eu até entendo o desespero dele. Qual a intenção do Appletun ao prolongar o combate? Certo que é uma tática comum, principalmente em níveis mais avançados, mas fazer isso por conta própria é a primeira vez que vejo. Cogitei a possibilidade do Fredo ser um pacifista, sei lá, vindo de Ylium, talvez ele não queira carregar o peso de uma vitória nas costas sabendo que causou ferimentos em alguém por isso. Mas pensando bem, um Leech Seed também causa danos, mesmo que indiretos... então nada de pacifista. De qualquer modo, quando eu também já estava exausto de analisar, eis que a batalha chega ao seu ápice com um movimento totalmente inesperado pelo Appletun. Acontece que a Ola fazia o possível para desviar das sementes que ele lançava para evitar que ela chegasse mais perto, e quando viu-se sem opções, o dragão culminou a energia obscura e num solavanco surpreendente, suspendeu olhos caídos, os esbugalhou e rugiu como uma exímia fera, aproximando-se com a sua carranca assombrosa e acertando a Corsola com um abrupto Astonish. Por um minuto é como se a alma da pequena coral fosse retirada de seu corpo, não só ela, como nós também.

— O-O que fo-foi isso...? — Gaguejamos em uníssono, enquanto o Grass-type resgatava seu semblante preguiçoso e vendo a sua adversária sem estado para continuar, voltava a roncar como anúncio de sua vitória.
— E-Eu nunca tinha visto ele fazer isso... — Drew ainda estava atônito pela cena, contudo, um breve sorriso desenhava-se em sua face. Parece que desse combate ele encontrou um fio de esperança afinal. — Haha! Eu sabia que ele era poderoso! Você viu aquilo, Jay Jay?!
— É... eu vi. Estou chocado até agora. — Recolhi a Corsola na pokéball para que pudesse descansar — Ele realmente atacou. Mas ainda não entendi que parâmetros ele utiliza e por que ele não te obedece...

A essa altura, para Drew pouco importava as preocupações anteriores. Ele estava feliz com o resultado obtido agora e tenho certeza de que vai usar isso para redescobrir sua relação com o Fredo.


No dia seguinte todo mundo já estava pronto para a viagem. A empolgação tomava conta, os ânimos se afloravam como se fôssemos adolescentes indo ao show de um ídolo, nada poderia estragar o dia! Só que não. Aghda tinha deixado um aviso pelo Dexit informando que sua ausência se dava pelo fato de já estar em Ylium e que deveríamos nos apressar para chegar lá. Entre os olhares curiosos, a verdade que nos assola: Não temos direito a condução exclusiva. Ou seja, é cada um por si para chegar até lá. Não me surpreende nem um pouco, num lugar onde fazemos mais serviços de limpeza que os próprios zeladores, era de se esperar que jogadores da divisão D não teriam uma regalia como essa. Enfim, como num bando de Tauros desregulados, corremos contra o tempo e contra a chuva para pegar o próximo trem para Ylium o mais rápido possível.

Desde já, que os jogos comecem!

---

Dados escreveu:NPC - Vs. Drew

Obs: Solicito fechamento de campanha. Sumário está atualizado. Grato.